As Escolas Pias de Lavapiés: recuperando as ruínas

O processo de recuperação das Escolas Pias de Lavapiés, em Madri, Espanha, permitiu a regeneração do ambiente urbano de um bairro inteiro, além de proporcionar à sede de uma universidade um espaço para as suas aulas e uma biblioteca. Com exemplos desse tipo, podemos fazer com que as ruínas e os prédios históricos ressurjam para permanecerem nas cidades e no imaginário da população.
As Escolas Pias de Lavapiés: recuperando as ruínas

Última atualização: 27 fevereiro, 2020

A intervenção nas Escolas Pias e seus arredores, no bairro de Lavapiés, em Madri, Espanha, é um exemplo magnífico de como podemos recuperar um edifício a partir de suas ruínas. Com uma intervenção que abrange diferentes escalas que vão desde o urbano até o design de interiores.

Além disso, podemos identificar o uso de diversos sistemas de construção, de modo que encontramos diferentes tipos de relação com o edifício pré-existente. Com a integração de novos materiais, houve um grande cuidado para que o todo tivesse uma linguagem unificada. 

A natureza da intervenção se reflete no princípio de unidade que se pretende conceder ao conjunto, independentemente das soluções particulares.

Escolas Pias de Lavapiés: projeto de intervenção

As Escolas Pias de Lavapiés: recuperando as ruínas

Imagem: J.L. de Diego – Madripedia

O projeto de intervenção nas Escolas Pias foi desenvolvido entre 1996 e 2004 e o prédio atualmente é ocupado pela sede “Escolas Pias” da UNED (Universidade Nacional de Educação à Distância daquele país), no bairro de Lavapiés. Este é um projeto único e dificilmente poderemos classificá-lo em qualquer categoria.

Isso ocorre porque ele abrange áreas de restauração, de reabilitação e de novas construções. Mesmo com todos os diferentes componentes que o integram, o projeto possui uma linguagem unificada, com unidades que dialogam entre si, conseguindo que o presente e o passado se harmonizem de uma maneira excepcional.

O projeto de recuperação das antigas Escolas Pias é uma obra do arquiteto José Ignacio Linazasoro. Ele propôs o desenvolvimento de um espaço cultural nas ruínas da igreja das antigas Escolas Pias de San Fernando e no terreno adjacente.

Esta intervenção foi proposta como uma ação urbana, que reorganiza a Praça de Agustín Lara, além de criar um estacionamento subterrâneo. O edifício abriga uma Universidade, que fica no terreno ao lado e uma biblioteca nas ruínas.

No imaginário deste bairro de personalidade forte, ficou consolidada a imagem das ruínas da Igreja. O bairro de Lavapiés é interessante, pois nos últimos tempos ele passou a abrigar uma população diversificada, com diferentes origens étnicas. 

O projeto foi baseado na enorme carga de referências que a história tem refletido no processo de desenvolvimento desse bairro.

História das Escolas Pias de Lavapiés

As Escolas Pias de Lavapiés: recuperando as ruínas

Imagem: open.ieec.uned.es

Fundada no coração do atual bairro de Lavapiés, em Madri, esta escola religiosa foi erguida inicialmente durante o século XVIII. A princípio, chamava-se Colégio de San Fernando, mas era conhecida no bairro como Colégio de Lavapiés.

O padre Juan García de la Concepción, capelão da capela de Pilar, fundou-a em 1729, em um terreno na Rua Mesón de Paredes. Ao lado desta capela, encontramos algumas ruínas, que dão testemunho da Guerra Civil ocorrida durante grande parte do século XX.

As humildes instalações da escola foram adaptadas para acomodar o grande número de crianças que a frequentavam. Em 1735, o pároco de San Justo, proprietário da capela, entregou-a permanentemente à Ordem dos Padres Escolápios.

A partir desse momento, a escola passou a se chamar Colégio de Nossa Senhora da Portería, devido a uma imagem da Imaculada Conceição da Virgem Maria. No ano de 1737, foram incorporadas três casas adjacentes à escola que, juntamente com o espaço já existente, se tornariam uma nova escola.

Graças a inúmeras doações, incluindo as dos Reis Carlos III e Carlos IV, a igreja foi erguida entre 1763 e 1791. Esta tarefa ficou a cargo do frade Gabriel Escribano. O design era de uma planta composta por uma nave quadrangular adjacente a uma rotunda, coroada com uma pomposa cúpula.

O acaso fez com que o nome fosse mudado para Colégio de San Fernando, embora a princípio ele fosse chamado de Nossa Senhora do Pilar, porque ficava inicialmente ao lado da antiga capela de Nossa Senhora do Pilar.

Na recuperação das Escolas Pias de Lavapiés, a igreja, um templo religioso, tem o seu uso transformado e se torna uma biblioteca, um templo do conhecimento.

As escolas Pias de Lavapiés durante a Guerra Civil Espanhola

As Escolas Pias de Lavapiés: recuperando as ruínas

Imagem: open.ieec.uned.es

Durante a Guerra Civil, o edifício foi incendiado em 19 de julho de 1936, apenas um dia após o início da Guerra Civil Espanhola. Alguns historiadores afirmam que o edifício foi saqueado arbitrariamente, já que as outras igrejas de Madri não foram danificadas.

Dizem que a Falange Espanhola usava a igreja como depósito de pólvora, dando treinamento e educação militar no pátio. Por isso, eles estavam entrincheirados dentro dela na noite de 18 de julho, dia do golpe de Estado que deu início à guerra civil.

Em 19 de julho, abriram fogo a partir de uma das torres da igreja, disparando com uma metralhadora. Como resultado, um vizinho foi ferido e outro foi morto. Em resposta a isso, os anarquistas da CNT tomaram o templo, incendiando-o e destruindo as imagens.

Ele ficou completamente abandonado e, ao contrário de outros edifícios importantes, não foi reconstruído, permanecendo da mesma forma que ficou após o incêndio. Em 2002, no entanto, houve uma intervenção no prédio para construir uma biblioteca e um Centro Associado da UNED.

O processo de recuperação

Recuperação das ruínas

Imagem: open.ieec.uned.es

O projeto de recuperação deste edifício histórico foi realizado para dar origem a salas de aula para a UNED. Ela ocupou o terreno vazio, resultado da demolição do Teatro Lavapiés. Também foi construída uma biblioteca nas ruínas da antiga igreja das Escolas Pias de San Fernando.

A biblioteca ocupa o que era a igreja anteriormente e se relaciona visualmente com as salas de aula e também através de uma escada paralela às paredes. O interior está dominado pelas ruínas, que se destacam sobre os novos materiais.

O projeto tenta estabelecer um diálogo entre a arquitetura moderna e as ruínas do passado. Soluciona de forma magistral a relação entre esses aspectos, além de resolver a integração dos volumes em diferentes escalas.

Neste projeto, passa-se de uma escala menor, apreciando a textura dos materiais, para uma escala urbana, onde podemos ver a relação da Biblioteca com o espaço público.

Sem dúvida, a intervenção nas Escolas Pias de Lavapiés é um excelente exemplo da recuperação de edifícios históricos naquele país para usos contemporâneos.